A reforma tributária traz muitas incertezas até a aprovação do texto final; no entanto, boa parte da proposta já permite que as empresas se planejem em sua estratégia tributária. Uma vez votado e aprovado o texto final da instituição dos impostos IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) e CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços), candidatos a substitutos de diversos impostos como o IPI, ICMS, PIS e Cofins, um regime misto até dezembro de 2032 se iniciará, onde empresas podem permanecer no regime em que estão ou podem migrar para a inovação da reforma. A decisão por aderir ao novo regime de imposto dependerá da situação em que cada empresário se vê diante do fisco, e podemos listar a base do que precisa ser observado.
O impacto do IVA em empresas de serviço
O imposto sobre valor agregado (IVA), por incidir sobre o valor adicionado ao produto na operação, tem impactos significativos em empresas que contribuem próximo de 100% na formação dos preços do que vendem ao mercado. Tanto empresas do Lucro Real quanto do Lucro Presumido, muitas vezes, desfrutam de alÃquotas efetivas menores do que os valores em que o IVA irá situar-se (sendo 28% o que o Senado sugere até o momento), principalmente pelas deduções de base de cálculo no Lucro Real e pela presunção de lucro abaixo da realidade de muitas empresas no caso do Lucro Presumido.
Exemplificando o funcionamento do IVA, tomemos, por exemplo, uma empresa de comércio que vende seus produtos por R$25,00 a unidade e possui um custo unitário de R$15,00. No novo regime, a base de cálculo do imposto será dada com o preço de venda (25 reais), menos o custo unitário (15 reais), ou seja, R$10,00. Aplicamos sobre a base a alÃquota de imposto e temos o tributo a ser pago, o qual, se fosse 28%, seria R$2,80 por unidade vendida. Supondo que nossa empresa do exemplo é do Lucro Presumido, precisamos aplicar o IRPJ e CSLL sobre uma presunção de 12% do faturamento bruto (25 reais), ou seja, 24% sobre R$3, resultando em R$0,72. Temos um total de R$3,52 a pagar. Comparando o mesmo exemplo com o regime atual, temos a alÃquota de 18% sobre o valor da mercadoria, o que resultaria em R$4,50 de imposto. Considerando o IRPJ e CSLL, chegamos ao total de R$5,22 de imposto.
Vemos claramente no exemplo que, para as empresas que contribuem pouco para a formação de preço de suas mercadorias e serviços, existe uma oportunidade de melhoria em sua situação fiscal. Apesar dessa possibilidade, em geral, empresas de serviço tendem a contribuir quase que completamente na formação de preço de seus produtos, ou seja, diante de um IVA, a base de cálculo é alta. No entanto, a boa notÃcia do novo regime é a não cumulatividade do imposto, o que pode trazer boas consequências para quem está no regime de Lucro Presumido.
Muitas empresas de serviços que optam pelo Lucro Presumido não se atentam ao fato de os impostos municipais e federais nesse regime serem cumulativos, ou seja, dispêndios com fornecedores não geram créditos de abatimento de imposto quando o fisco cobra pelas vendas.
O IVA em relação ao Lucro Presumido pode ter um custo de oportunidade vantajoso, dependendo do quanto a cumulatividade de impostos é significativa na operação. Por essa razão, vale o estudo interno para saber se, ao final de 2026, optar pelo novo regime trará recuperabilidade de impostos suficientes para compensar a alÃquota sobre a base de cálculo.
No caso de empresas do Lucro Real que conseguem abater bastante a base de cálculo de seus impostos, bem como se beneficiam de incentivos fiscais regionais, o interessante é permanecer no regime atual o máximo possÃvel, visto que a tentativa de acabar com a competição fiscal entre os Estados e MunicÃpios na reforma acabará por invalidar as boas estratégias tributárias que o Lucro Real permite adotar.
O impacto do IVA nas indústrias
No caso das indústrias, o IVA será benéfico até mesmo para empresas enquadradas no Lucro Presumido. Os motivos disso são principalmente dois: 1) O valor que as indústrias agregam em seus produtos é geralmente baixo, o que torna a base de cálculo dos impostos tendenciosa para a vantagem; 2) A onerosidade da substituição tributária na indústria, principalmente a substituição para frente, não mais será aplicada aos optantes do IVA.
Os custos de conformidade também tendem a ser menores no novo regime, visto que temos a agregação de cinco impostos em um só. A regra da reforma tributária que define que a jurisdição do tributo é determinada pelo local em que o produto ou serviço é consumido também encerra a necessidade de especialistas tributários precisarem opinar sobre produtos fabricados em mais de um Estado e recebendo alÃquotas diferentes dependendo da logÃstica de produtos semiacabados. É bem verdade que aproveitar as diferenças de alÃquota entre municÃpios não será mais possÃvel por meio de filiais em outras localidades, porém a simplificação e unificação dos impostos que pesam para a indústria são bem-vindas.
Como a fase de teste do IBS e CBS será concluÃda em 2026, a opção pelo regime da reforma ainda levará tempo; além disso, a fase de observação pode levar a mudanças de alÃquota, tornando o custo de oportunidade de um pelo outro melhor ou pior.
O que não podemos discordar é de como o novo formato dos impostos ajuda empresas sujeitas à substituição tributária para frente, em que o produtor paga imposto por toda a cadeia com base em uma alÃquota presumida de margem. A Ambev é um famoso exemplo de companhia sujeita a esse regime, principalmente pela dificuldade da Receita de tributar bares e restaurantes na comercialização de bebidas alcoólicas. Empresas nessa situação têm uma grande oportunidade de diminuÃrem sua oneração, ainda que haja alguma recuperação de crédito tributário para quem está no Lucro Real.
É importante reforçar o aproveitamento de todos os benefÃcios fiscais de diferença de alÃquota entre Estados e MunicÃpios, assim como verificar até onde o uso desse enquadramento vale a pena em vista do IVA.
Conclusões finais
É importante que os empresários acompanhem de perto os desdobramentos da nova reforma para se prepararem para o que está por vir. Essa primeira reforma tributária também dá forma a outras reformas em discussão, como, por exemplo, a reforma do imposto de renda, o qual precisa atualizar sua tabela de progressão de alÃquota defasada desde 2015.
As empresas de serviço são, com certeza, as mais impactadas pela onerosidade potencial do IVA, ainda mais considerando que o IRPJ não está em vias de reforma e pode se somar de forma negativa à alÃquota potencial de 28% que o texto atual apresenta.
Sem dúvida, a consolidação de nosso sistema tributário aos moldes dos sistemas internacionais proporcionará um ambiente de negócio mais interessante para o investimento estrangeiro, bem como regras mais claras proporcionam um ambiente de negócios mais propÃcio no longo prazo.
Os empresários terão, no curto prazo, a preocupação maior com os custos de conformidade e desafios de mudanças de processos e sistemas, o que vai ofuscar os benefÃcios do IVA por bons meses ou até anos. Passada a etapa de implementação do IVA, todas as adaptações exigidas pela observação da arrecadação pela Receita Federal ao fim de 2026 darão forma aos benefÃcios e impactos negativos da reforma tributária.
Sobre o Autor do artigo
Arthur Policarpo Sales – Coordenador da área de Finanças Corporativas na PRX Capital.
Graduado em Ciências Econômicas, encontra-se atualmente em formação como contabilista.